Quando falamos ou pensamos em saneamento básico, é muito frequente relacionarmos o termo com os serviços de tratamento de água e esgoto. No entanto, a verdade é que o saneamento vai muito além disso. O fornecimento desses serviços provoca vários impactos na sociedade, tornando importante entender e discutir a relação entre saneamento básico e cidadania.
No Brasil, a universalização do saneamento básico ainda é um grande desafio. Existem diversas diretrizes para que esses serviços cheguem a todos e todas, mas ainda estão longe de serem cumpridas, pois demandam grandes investimentos e capacidade de planejamento para a estruturação de bons projetos e um bom Plano Municipal de Saneamento Básico.
A falta de acesso aos serviços afeta a qualidade de vida, a saúde e a segurança da população. Além disso, o saneamento básico também está diretamente relacionado com a preservação do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável de toda a economia do país.
Se você quer saber mais sobre o assunto e ainda descobrir o que esse setor pode mudar nos próximos anos, fique conosco e confira neste post:
- o que é o saneamento básico;
- quais são os impactos causados na sociedade;
- qual é a relação entre saneamento básico e cidadania;
- como ele interfere na saúde da população;
- quem é responsável pelo saneamento básico;
- por que é preciso focar nesse serviço;
- como alavancar os investimentos em saneamento básico.
Aproveite a leitura!
1. O que é o saneamento básico?
Com o desenvolvimento social da humanidade, que levou a grandes intervenções na natureza para a construção de cidades e todas as suas infraestruturas, muitas consequências foram geradas, como a produção de lixo e outros dejetos concentrados em determinadas regiões.
Entre outras coisas, a criação de um espaço urbano demanda uma estrutura para fornecimento de água potável e encanada, de um local para depositar todo o lixo gerado, de um método de coleta e tratamento dos dejetos produzidos pelos seres humanos, do escoamento da água da chuva em áreas construídas e assim por diante. Todos esses fatores são determinantes para a saúde pública.
Imagine, por exemplo, uma cidade onde a água seja fornecida sem qualquer tratamento prévio, ou que os lixos sejam depositados em terrenos baldios, proliferando pragas e contaminando o solo, além de alagamentos toda vez que chover. Nesse caso, a população sofreria constantemente com todo tipo de doença, problemas urbanos e falta de qualidade de vida, enquanto o meio ambiente estaria em constante degradação.
Para evitar esse tipo de problema e proporcionar uma vida com mais dignidade para as pessoas, é necessário fornecer uma estrutura completa de cuidados integrados, que só surge a partir de um plano bem elaborado, considerando um a um desses serviços. Foi em meio a essas necessidades que surgiu o saneamento, palavra derivada do latim que significa tornar algo saudável ou higiênico.
O Saneamento Básico é oficialmente descrito pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) como:
conjunto de serviços, infraestruturas e instalações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem de águas pluviais urbanas.
Trata-se de um direito garantido por lei em todo o território nacional e está assegurado pela Constituição Federal e pela lei de número 11.445/2007. Basicamente, a legislação determina que todo cidadão brasileiro tem direito ao acesso à água tratada, à rede de coleta de esgoto, ao manejo do lixo e outros serviços básicos.
Existem países que já alcançaram a universalização desses serviços, o que significa que todas as pessoas têm acesso a eles. No Brasil, por outro lado, apesar de existirem leis sobre isso desde a década de 70, foi só em 2007 que diretrizes claras foram estabelecidas para o saneamento básico.
Para contribuir com o serviço dos estados e municípios, foi criado o Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB). Ele fixava as datas e entregas que deveriam ser feitas para que esses serviços alcançassem toda a população. Após a última revisão do plano, ocorrida em 2019, o investimento previsto para universalizar o saneamento até o ano de 2030 no Brasil era de 20 bilhões de reais anuais.
Novo Marco Legal do Saneamento
Diante do desafio, em julho de 2020 foi sancionado o Novo Marco Legal do Saneamento, a Lei 14.026/2020, que reúne uma série de regulamentações que visam a expandir os serviços de saneamento básico no país e estabelecem novas metas para universalização do acesso ao saneamento:
- 90% da população com acesso à coleta de esgoto até 31 de dezembro de 2033 (53,2% em 2018);
- 99% da população com acesso à água tratada até 31 de dezembro de 2033 (83,6% em 2018).
2. Quais são os impactos causados na sociedade?
O saneamento básico acaba afetando muitos aspectos sociais, desde as condições de saúde, qualidade de vida e até o desenvolvimento econômico de um local. No entanto, ainda é difícil apontar ao certo as proporções desses impactos.
O que se sabe hoje é que 7% das internações ocorridas no Brasil são por doenças infecto-parasitárias, na sua maioria causadas pela falta de saneamento. Alguns exemplos disso são diarreias, leptospirose, febre tifóide, etc. Essas doenças também estão ligadas às taxas de mortalidade infantil.
Naqueles locais considerados mais desenvolvidos, é possível identificar uma incidência muito maior da priorização do saneamento no planejamento público. No entanto, isso não ocorre nas comunidades mais carentes e nos locais com moradias não regularizadas, em que existem muitos lugares onde não são fornecidas as condições básicas de proteção às famílias.
Sob um outro viés, a falta de saneamento básico afeta também a preservação ambiental e todo o desenvolvimento local. Também pode prejudicar o turismo e a geração de renda de toda uma comunidade. Portanto, fornecer serviços de qualidade é um passo importante, que significa um compromisso com as pessoas, com com o presente, com as gerações futuras e também com a natureza.
3. Qual é a relação entre saneamento básico e cidadania?
O acesso à água tratada e ao serviço de esgotamento sanitário são direitos humanos reconhecidos há anos pelas Nações Unidas. Para isso, são necessárias ações transformadoras para que os serviços sejam universalizados e as pessoas tenham, principalmente, acesso à fornecimento regular de água tratada e à coleta e tratamento de esgotamento sanitário.
É importante levar em consideração, também, que a desigualdade no acesso aos serviços de saneamento tem impacto também em outros direitos humanos, como saúde, segurança, moradia adequada, educação e alimentação.
Exemplo disso é que um estudo conduzido pela BRK identificou que a falta de saneamento se concentra nas camadas mais pobres da população feminina brasileira. Desse modo, a universalização dos serviços e o aumento de renda a ela associado trariam uma redução da incidência de pobreza nas famílias. Além disso, estimou-se que 3 em cada 4 mulheres que deixariam a condição de pobreza seriam negras, o que ressalta o caráter inclusivo da universalização do saneamento.
Por fim, vale observar que a redução da pobreza não seria o único efeito para as gerações de jovens do país. Ela traz também redução do atraso escolar e melhora no desempenho nos estudos, com efeitos futuros sobre a produtividade, o que eleva ainda mais o potencial de renda no futuro.
4. Como o saneamento básico interfere na saúde da população?
Quando o assunto é saúde pública, o saneamento básico ganha ainda mais relevância. Sem o devido tratamento da água, a coleta e o tratamento de esgoto, a coleta e destinação adequada de lixo e a drenagem da água da chuva, muitas regiões passam a ficar em condições de insalubridade.
A precarização desses sistemas facilita a propagação e a exposição da população a uma série de doenças, além de perigos relacionados à contaminação por metais pesados e outros componentes. Mesmo a ausência de um desses serviços já causa grande impacto na qualidade de vida dos moradores.
Segundo a terceira edição do Atlas do Saneamento: Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário, lançado em 2021 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as Doenças Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado (DRSAI) causaram cerca de 0,9% das mortes que ocorreram no país de 2008 a 2019. Já entre óbitos causados apenas por doenças infecciosas e parasitárias, essas as DRSAI representaram 21,7% das mortes no mesmo período.
De acordo com o estudo, na década analisada foram notificados no Brasil 12 milhões de casos de doenças causadas pela falta de saneamento, com quase 5 milhões de internações no Sistema Único de Saúde (SUS). As doenças que mais causaram mortes foram a Doença de Chagas, a diarreia e a disenteria. Juntas, elas são responsáveis por quase 81,5% dos óbitos no período.
Em geral, as regiões com condições mais precárias ou inexistentes de coleta de esgoto apresentam maior recorrência de internação por diarreia e outras doenças. A explicação está na falta de esgotamento sanitário adequado, já que esgoto a céu aberto colabora para a proliferação dessas doenças. A consequência disso é um alto custo com internações e com o tratamento das doenças para a saúde pública.
Os prejuízos não param por aí. O consumo de água de má qualidade ou o contato com esgoto a céu aberto, bem como tantas outras condições insalubres, comprometem não apenas o estado de saúde das pessoas, mas também o bem-estar econômico e social. Pessoas doentes se afastam dos seus trabalhos, estudos e das relações sociais, param de gerar renda, comprometem seu desenvolvimento e impactam em toda a economia. É um efeito-cascata.
5. Quem é responsável pelo saneamento básico?
No Brasil, o saneamento básico é de responsabilidade do município, que deve decidir entre implantar e operar os sistemas por meio de uma autarquia ou repassar essas atividades para uma companhia pública ou privada. No Brasil, para alcançarmos a universalização nos próximos 10 anos, é preciso que haja mais investimentos no setor. Nos últimos oito anos, a média dos investimentos foi de R$ 13,6 bilhões, oito bilhões a menos do que o necessário.
Ao aumentar a participação privada no setor de saneamento, é possível avançar com mais rapidez para alcançar a universalização, já que essas companhias têm uma maior capacidade de investimento. Essa é uma das soluções, especialmente porque, juntos, os setores público e privado têm mais potencial para mudar o cenário do saneamento no país em um curto espaço de tempo.
Também é muito importante entender que, apesar da obrigação legal de proporcionar o acesso aos serviços pertença à gestão pública, todos os brasileiros e brasileiras são responsáveis por um saneamento básico de qualidade. Garantir o bom funcionamento e aproveitamento dos serviços fornecidos é uma responsabilidade de toda a sociedade. Por isso, a educação ambiental deve fazer parte do plano de saneamento básico. Muito pode ser ensinado para a população para evitar problemas simples e reduzir desperdícios, como:
- a economia e o uso consciente da água;
- a correta separação e descarte de resíduos sólidos;
- a interligação correta da residência na rede de esgoto e rede de drenagem pluvial;
- a conscientização sobre o descarte indevido de resíduos nas redes de esgoto.
Existem diversos problemas que ocorrem pela falta de educação e orientação à população sobre como usar os serviços fornecidos, e nosso blog está aqui para auxiliar com essas informações. O desperdício de água nas casas e indústrias, o entupimento de canos por descarte indevido de resíduos sólidos, o despejo de esgoto para os rios e tantos outros fatores contribuem para a situação de insalubridade de muitos locais.
Além da conduta individual de contribuição com o saneamento básico, a população tem papel fundamental no que diz respeito à fiscalização e cobrança dos órgãos governamentais, para ajudar a manter ordem e o bom funcionamento dos recursos existentes. Dessa forma, esse é um trabalho conjunto.
6. Por que é preciso focar em saneamento básico?
O conceito de cidades sustentáveis previstos pela ONU coloca o saneamento como um dos principais eixos de desenvolvimento dos municípios. Sem os serviços de saneamento temos perda de qualidade ambiental e serviços ecossistêmicos, com afetação direta na saúde das pessoas, impactando os serviços hospitalares e morbidade.
Sob o ponto de vista econômico, quanto piores as condições dos serviços de saneamento, maiores são as chances de contaminação por parte da população. Mais afastamentos clínicos produzem ausências no trabalho, perda de produtividade e de renda, especialmente no caso de profissionais autônomos. As consequências disso afetam tanto a família quanto a comunidade.
Uma população sem condições básicas de saneamento sofre consequências na saúde, na educação, na renda e até no índice de felicidade, em razão dos impactos na qualidade de vida e na dignidade das pessoas. Isso tudo sem mencionar os custos com o tratamento de doenças e a perda de vidas. Parece impossível avançar no desenvolvimento sustentável das cidades sem esses elementos.
Além de todos os motivos de saúde e segurança pública, é importante entender a situação atual do saneamento básico brasileiro. De acordo com as estatísticas divulgadas pelo Trata Brasil, esses são alguns dos dados mais relevantes sobre as condições de fornecimento de água e esgoto para a população:
- 84% da população brasileira tem abastecimento de água tratada, no Norte, esse número cai para 58,9%;
- aproximadamente 35 milhões de pessoas não têm acesso a esse serviço no país;
- 14,3% do número de crianças e adolescentes não têm acesso à água;
- 6,8% das crianças e dos adolescentes não contam com sistema de água dentro de suas casas;
- apenas 55% dos brasileiros têm coleta de esgoto, no Norte, 13,1% da população conta com esse serviço;
- 3,1% de crianças e adolescentes não têm vaso sanitário em casa;
- 50,8% dos esgotos em todo o país são tratados.
Apesar desses dados, existem algumas cidades que se destacam no ranking de saneamento e que merecem ser observadas de perto. Esses municípios adotaram medidas e soluções que transformaram as condições de saúde e qualidade de vida para toda a sua população.
Medidas básicas como tratamento de águas e esgoto e coleta seletiva de resíduos, por exemplo, podem impactar significativamente nos resultados ambientais de cidades e países, contribuindo para:
- a queda na extração desnecessária de recursos naturais;
- a redução da poluição da água, do solo e do ar;
- a diminuição de custos de produção por reaproveitamento;
- a geração de empregos;
- a economia na limpeza pública.
Isso é uma pequena demonstração de como cada ação adotada pode contribuir para um saneamento básico de qualidade e uma comunidade melhor. Essas diretrizes não precisam estar centralizadas no governo. A educação é uma ferramenta crucial para conscientizar e disseminar conhecimento sobre a importância do cuidado com esses serviços para todos.
7. Como alavancar os investimentos em saneamento básico?
De acordo com o Trata Brasil, Em 2019, o Brasil investiu 15,7 bilhões para melhorias em saneamento básico, um acréscimo de 18,9% em relação a 2018, quando o total investido foi de R$ 13,2 bilhões.
Com uma maior participação da iniciativa privada no saneamento brasileiro, a tendência é que esses números aumentem ainda mais. Primeiramente, com a concorrência, as oportunidades de boas propostas crescem consideravelmente. Com isso, aumentam os benefícios e, é claro, os investimentos na área.
Além disso, quando esses serviços são assumidos por concessionárias privadas, o trabalho é realizado com metas claras estabelecidas em contratos, como metas de expansão e de universalização dos serviços, de redução de perdas de água, etc. Isso significa que são realizados investimentos, também previstos em contrato, para a modernização dos sistemas existentes, serviços mais eficientes e melhor cobertura da infraestrutura.
8. Quais são as próximas tendências em saneamento básico?
Apesar de vivermos uma realidade na qual ainda não existe a universalização do saneamento básico no Brasil, é interessante acompanhar as tendências e inovações previstas para esse segmento, já que são mudanças que podem ser adotadas desde a implantação das novas estruturas. Especialmente sob a perspectiva da sustentabilidade, a adoção de novas tecnologias é vista como algo indispensável.
Por tecnologia entendem-se todos aqueles métodos, ferramentas e técnicas que têm por objetivo solucionar um problema existente. À medida que evolui, a tecnologia vai adotando novos instrumentos e aderindo aos conhecimentos científicos produzidos ao longo dos anos.
No saneamento básico não é diferente. Muitas empresas têm se dedicado a melhorar os resultados obtidos com esses serviços, seja por meio da redução do uso de produtos químicos no tratamento dos efluentes ou mesmo pela tentativa de automatizar a operação de diversas etapas de fluxo, por exemplo.
No Brasil, já existem algumas tecnologias que vêm revolucionando o modo como o saneamento é realizado. Alguns exemplos disso são os medidores online de qualidade de água, que torna o controle mais rígido e eficiente, e os programas de redução da perda de água tratada com sensores tecnológicos por pressão, acústica e até mesmo via satélite, facilitando a identificação de anormalidades na rede.
Outras tendências já são apontadas, como a substituição do método de filtração no processo de tratamento da água, que hoje é realizado por grandes filtros de areia, por membranas. Em geral, o objetivo é tornar o saneamento mais eficiente e eficaz. Isto é, implantar estruturas que ocupem menos espaço, economizem recursos, que possam ser automatizadas e ainda entreguem resultados de qualidade superior.
O saneamento básico não é um assunto banal e tampouco deve passar despercebido para a população. Esse é um fator de grande relevância para a saúde pública, para o desenvolvimento econômico e social de um país e para a qualidade de vida das pessoas. Por isso, é importante se manter atento e informado e aproveitar as oportunidades para aprender, educar e conscientizar todas as pessoas de seus direitos e deveres como cidadãos.
Quando uma população tem acesso à água tratada, à coleta e ao tratamento dos esgotos, ao devido recolhimento e destinação adequada de resíduos e das águas pluviais, isso tudo aumenta a sua qualidade de vida e a sua dignidade. Há impacto direto em índices fundamentais, como a redução da mortalidade, especialmente a infantil.
A relação entre saneamento básico e cidadania apresenta seus reflexos na geração de renda, na saúde, na dignidade e até no índice de felicidade das pessoas. A educação avança e as cidades se desenvolvem. O meio ambiente se beneficia da despoluição das suas águas e a preservação desse recurso. Todos saem ganhando.
Se você quer continuar aprofundando seu conhecimento sobre saneamento básico e cidadania, que tal aprender mais sobre o que é universalização do saneamento e por que ela está tão distante do ideal?
BRK
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